terça-feira, 16 de outubro de 2018

Nem sequer.

Ébrio e saudoso, não escrevo este poema. 
Sequer me coloco alheio à alegria do mundo. 
Não acendo este cigarro. 
Nem me coloco à deriva de meus pensamentos. 

Há, no entanto, sentimento peculiar 
Que anuncia a felicidade de estar aqui, 
Em tempo dissonante, 
Circunstância idêntica, 
Lugar comum, nossas vidas as mesmas. 

Não falamos sobre antigas namoradas, 
Sequer olhamos para trás e rebobinamos o destino. 
Nem nos sentimos infelizes; 
E eu, não produto de uma não nostalgia, 
Encontro lugar exatamente onde estou. 
Feliz e conciso. 

Quem me dera, ó Dara, 
Tivesse preocupações, 
Não soubesse que vida viver, 
Me fizesse triste por não tê-la comigo, 
Em momentos como este, 

Em que não reflito sobre a vida, 
Sequer acendo este cigarro, 
E a desejo mais que meus pensamentos, 
Em vez de pensar em escrever este poema. 

(As ondas não me apagam. 
E às estrelas não me encaminho, 
De onde ela possa não vê-las 
Mesmo que tão distante...)

Brunno Freire

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Saara e o muçulmano.

Corpo na margem 
A água o devolveu 
Sopro da vida 
Escolheu o ateu 
Viva meu filho 
Não morra em vão 
Todo passageiro 
Terá que abrir mão 
Volte pra casa sem desespero 
Suporte encarar as marcas ao espelho 
Prefira sentir tudo que vem 
Pense nas almas 
Sem futuras primaveras. 

O pedido de ajuda 
O salto de coragem 
Tudo registrado 
Alguém pra conversar 
Respeito ao próximo 
Simpatia e admiração 
Dos anjos que eu vi 
No calor alucinante 
Do deserto ela estendeu a mão 
Duas confusões se encontram 
Colidem violentamente 
Acidente de trem-bala 
Chuva de pertences 

Encontro as pressas 
Num tato, contato 
Seus olhos fitam o chão 
Meus olhos fitam os seus. 
Coincidências remontadas 
Assunto promissor 
Contemplação do nu 
Gente humilde 
Estrada nova, areia no chão 
Olhos coloridos, alma lavada 
No suor que sai sem pressa. 
Dois sozinhos no deserto, 
Não mais, não depois 
Do cheiro que tem o Saara.